Estamos inaugurando a coluna Ponto de Vista com um tema que
gera intensos debates no meio condominial. Os condomínios residenciais têm sido cada vez mais procurados para o aluguel por curta temporada, principalmente por conta do crescimento constante dos
serviços de hospedagem, que permitem ao proprietário a divulgação de seu imóvel de maneira prática e com um alcance considerável.

Conforme dados do Airbnb, maior plataforma de acomodação por curta temporada do mundo, o ano de 2022 foi encerrado com 6,6 milhões de anúncios ativos em todo o mundo. São mais de 220 mil
anúncios apenas no Brasil. Apesar da popularização do serviço, a reserva de imóveis por temporada, caracterizada pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) como uma espécie de contrato atípico de hospedagem, é permitida caso a convenção do condomínio não preveja a destinação residencial das unidades. Dessa maneira, cabe a cada condomínio horizontal ou vertical decidir se a locação das unidades por meios digitais deve ser permitida ou não.

Confira o ponto de vista de dois síndicos, sendo um profissional e um condômino, sobre o assunto!

Revista Condomínio & Mercado Imobiliário – Você é a favor ou conta a locação de unidades por meio de plataformas digitais?

Saulo Jorge (Síndico profissional) – Pontos positivos: A locação via plataformas digitais oferece flexibilidade para os proprietários, permitindo que rentabilizem suas unidades em períodos ociosos. Isso pode gerar maior retorno financeiro e dinamizar o uso dos imóveis. Além disso, promove o
turismo local e a economia compartilhada.
Pontos negativos: Essa prática pode causar rotatividade alta de pessoas no condomínio, aumentando o desgaste das áreas comuns e a necessidade de manutenção. Além disso, pode gerar conflitos entre
moradores devido ao comportamento inadequado de alguns hóspedes temporários e à falta de integração com a comunidade condominial. Importante fazer um controle de acesso real e eficiente, e lógico, ter a devida aprovação na convenção do prédio.

Andrea Tartuce (Síndica do Condomínio Maceió Facilities) – Sou a favor. Entendo que o proprietário tem o direito de explorar seu imóvel seja por locação temporária ou anual. O proprietário que explora essa atividade traz para si uma responsabilidade maior de zelar, tanto pelo seu apartamento, quanto pelo condomínio, pois isso refletirá diretamente no produto que ele está vendendo, uma vez que o hóspede avalia a experiência na plataforma, sujeitando a outro pretenso “hóspede” não escolher aquela opção, inclusive por problemas no condomínio. Isso não ocorre na locação permanente.

RC&MI: Você acredita que essa modalidade de locação traz desafios para os condomínios em relação à segurança?

SJ – A locação por plataformas digitais pode comprometer a segurança dos condomínios devido a constante entrada e saída de pessoas desconhecidas. A identificação prévia dos hóspedes muitas vezes
é limitada, dificultando o controle de acesso e aumentando o risco
de atividades ilícitas ou indesejadas. Além disso, a falta de familiaridade dos hóspedes com as normas do condomínio pode resultar em comportamentos que coloquem a segurança em risco, como o não
uso de dispositivos de segurança ou a circulação em áreas restritas. É primordial que seja implantado o controle de acesso.

AT – Sim. Deve haver pelo condomínio o regramento para a coleta e a conferência de dados dos hóspedes para liberação de acesso. Por isso, o sindico deve cobrar dos proprietários que exercem essa atividade um comprometimento do atendimento daquela regra. O proprietário é o responsável pela unidade, e, ao receber a reserva, deve solicitar os dados cadastrais de todos os hóspedes que irão se hospedar no apartamento (RG, CPF, endereço), bem como transmitir aos hóspedes as regras gerais do condomínio, eis que a eles se aplicam as mesmas regras que aos demais condôminos.

RC&MI: De alguma forma a convivência entre moradores permanentes e hóspedes temporários pode ser afetada pela locação via plataformas digitais?

SJ – Sim, a convivência pode ser afetada, pois moradores permanentes podem sentir que sua privacidade e segurança estão comprometidas pela presença constante de novos hóspedes. Além disso, os
hóspedes temporários podem não ter o mesmo compromisso com as regras de convivência do condomínio, gerando incômodos como barulho excessivo, uso inadequado das áreas comuns e desrespeito às normas internas. Isso pode gerar um ambiente de tensão e conflitos entre moradores e hóspedes.

AT – Acredito que é possível. Seja proprietário, seja inquilino, seja
hóspede por temporada, todos estão sujeitos às regras. E a desobediência delas por qualquer um que seja, traz descontentamento aos outros. Afinal, ao morar em condomínio o seu direito termina onde começa o do seu vizinho.

RC&MI: Quais medidas de controle ou regulamentação você considera necessárias para equilibrar o direito dos proprietários de alugar suas unidades e o bem-estar dos demais moradores?

SJ – É essencial que o condomínio estabeleça regras claras e específicas para a locação por plataformas digitais, como a necessidade de cadastro prévio dos hóspedes e a limitação de acessos a áreas
comuns. A implantação de sistemas de controle de acesso, como biometria ou cartões magnéticos, também pode ajudar a monitorar a circulação de pessoas. Além disso, é importante definir multas ou
penalidades para o descumprimento das normas, garantindo que todos, inclusive os proprietários que alugam suas unidades, respeitem as regras estabelecidas. A regulamentação interna deve ser debatida
e aprovada em assembleia, assegurando que atenda aos interesses da maioria.

AT – O cadastro prévio é imprescindível, tal como a presença do proprietário ou um representante na chegada do seu hóspede, de forma a não somente apresentar todos os ambientes do condomínio e suas
regras de utilização, bem como não sobrecarregar aos funcionários do condomínio com atribuições que não lhe são cabíveis. O proprietário de apartamento de temporada tem que ter em mente que ele tem que se adaptar ao condomínio, e não o contrário.

RC&MI: Você acredita que a locação por plataformas digitais traz mais benefícios ou problemas para o condomínio? Por quê?

SJ – A resposta depende do perfil do condomínio e da forma como a locação é gerida. Em condomínios que adotam medidas eficazes de controle e onde os proprietários e hóspedes respeitam as normas,
os benefícios podem superar os problemas, oferecendo rentabilidade e dinamismo. No entanto, em condomínios com fragilidades na segurança e na convivência, os problemas tendem a prevalecer, gerando conflitos, desgaste das áreas comuns e comprometimento da segurança e da tranquilidade dos moradores. Portanto, a chave para o equilíbrio está na regulamentação adequada e na conscientização de
todos os envolvidos.

AT – Desde que observadas as regras previstas no regimento do condomínio, acredito que essa modalidade pode ser exercida sem maiores problemas. A legislação já autoriza a exclusão do condômino antissocial. E isso se aplica ao proprietário da unidade cujos hóspedes venham a causar problemas.